terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Cachaça, pinga e água ardente.

A cachaça, pinga, ou cânha (no Rio Grande do Sul) é o nome dado à aguardente de cana, uma bebida alcoólica tipicamente brasileira. Seu nome pode ter sido originado da velha língua ibérica – cachaza – significando vinho de borra, um vinho inferior bebido em Portugal e Espanha, ou ainda, de "cachaço", o porco, e seu feminino "cachaça", a porca. Isso porque a carne dos porcos selvagens, encontrados nas matas do Nordeste – os chamados caititus – era muito dura e a cachaça era usada para amolecê-la. [1].

É usada como coquetel, na mundialmente conhecida "caipirinha".

É obtida com fermentação da garapa de cana-de-açúcar ou do melaço e sua posterior destilação.

A cana-de-açúcar, elemento básico para a obtenção, através da fermentação, de vários tipos de álcool, entre eles o etílico. É uma planta pertencente à família das gramíneas (Saccharum officinarum) originária da Ásia, onde teve registrado seu cultivo desde os tempos mais remotos da história.

Os primeiros relatos sobre a fermentação vem dos egípcios antigos. Curam várias moléstias, inalando vapor de líquidos aromatizados e fermentados, absorvido diretamente do bico de uma chaleira, num ambiente fechado. Os gregos registram o processo de obtenção da acqua ardens. A água que pega fogo - água ardente (al kuhu). Alquimistas tomam conhecimento da água ardente, atribuindo-lhe propriedades místico-medicinais. Transforma-se em água da vida, e a eau de vie é receitada como elixir da longevidade.

A aguardente então vai da Europa para o Oriente Médio, pela força da expansão do Império Romano. São os árabes que descobrem os equipamentos para a destilação, semelhantes aos que conhecemos hoje. Eles não usam a palavra al kuhu e sim al raga, originando o nome da mais popular aguardente da península arábica: arak, uma aguardente misturada com licores de anis e degustada com água. A tecnologia de produção espalha-se pelo velho e novo mundo. Na Itália, o destilado de uva fica conhecido como grappa. Em terras Germânicas, se destila a partir da cereja o Kirsch; na antiga tchecoslováquia, atualmente dividida em República Tcheca e República Eslovaca, a destilação da Sleva (espécie de ameixa) gera a slevovice (lê-se eslevovitse). Na Escócia se populariza o whisky, destilado da cevada sacarificada. No Extremo Oriente, a aguardente serve para esquentar o frio das populações que não fabricam vinho. Na Rússia a vodca, de centeio. Na China e no Japão, o saquê, produzido a partir da fermentação do arroz é frequentemente confundido com uma aguardente devido ao seu elevado teor alcoólico, mas é na verdade um vinho. Portugal também absorve a tecnologia dos árabes e destila, a partir do bagaço de uva, a bagaceira.

Já em 1530 os primeiros donatários portugueses decidem começar empreendimentos nas terras orientais do Novo Mundo, implementando o engenho de açúcar com conhecimento e tecnologia adquiridos nas Índias Orientais, vindas do sul da Ásia. Assim surgem na nova colônia portuguesa os primeiros núcleos de povoamento e agricultura.

A geração inicial de colonizadores apreciava a bagaceira portuguesa e o vinho do porto. Assim como a alimentação, toda bebida era importada da metrópole. Num engenho da capitania de São Vicente, entre 1532 e 1548, descobrem o vinho de cana-de-açúcar - garapa azeda, que fica ao relento em cochos de madeiras para os animais, vinda dos tachos de rapadura. É uma bebida limpa, em comparação com o cauim - vinho produzido pelos índios, no qual todos cospem num enorme caldeirão de barro para ajudar na fermentação do milho. Os senhores de engenho passam a servir o tal caldo, denominado cagaça, para os escravos. Daí é um pulo para destilar a cagaça, nascendo assim a cachaça. Antonil procura distinguir "aguardente" de "cachaça", mas se considera que essa diferença não existe na prática. Em 1584 o Memorial de Gabriel Soares de Sousa faz referências a "oito casas de cozer méis" na Bahia.

Dos meados do século XVI até metade do século XVII as "casas de cozer méis" se multiplicam nos engenhos. A cachaça torna-se moeda corrente para compra de escravos na África. Alguns engenhos passam a dividir a atenção entre o açúcar e a cachaça. A descoberta de ouro nas Minas Gerais, traz uma grande população, vinda de todos os cantos do país, que constrói cidades sobre as montanhas frias da Serra do Espinhaço. A cachaça ameniza a temperatura.

Incomodada com a queda do comércio da bagaceira e do vinho portugueses na colônia e alegando que a bebida brasileira prejudica a retirada do ouro das minas, a Corte proíbe a partir de 1635 várias vezes a produção, comercialização e até o consumo da cachaça. Sem resultados, a Metrópole portuguesa resolve taxar o destilado. Em 1756 a aguardente de cana-de-açúcar foi um dos gêneros que mais contribuíram com impostos voltados para a reconstrução de Lisboa, destruída no grande terremoto de 1755. Para a cachaça são criados vários impostos conhecidos como subsídios, como o literário, para manter as faculdades da Corte.

Com o passar dos tempos melhoram-se as técnicas de produção. A cachaça é apreciada por todos. É consumida em banquetes palacianos e misturada ao gengibre e outros ingredientes, nas festas religiosas portuguesas - o famoso quentão.

Devido ao seu baixo valor e associação às classes mais baixas (primeiro os escravos e depois os pobres e miseráveis), a cachaça sempre deteve uma áurea marginal. Contudo, nas últimas décadas, seu reconhecimento internacional tem contribuído para diluir o índice de rejeição dos próprios brasileiros, alçando um status de bebida chique e requintada, merecedora dos mais exigentes paladares. Atualmente várias marcas de boa qualidade figuram no comércio nacional e internacional e estão presentes nos melhores restaurantes e adegas residenciais pelo Brasil e pelo mundo.A cachaça pertence à nobre família das aguardentes, da eau-de-vie ou aquavit. Trata-se de um destilado feito à base de cana-de-açúcar, leveduras e água.

O processo de produção inicia-se com a escolha da variedade adequada da cana de açúcar e plantio da mesma. Conforme a região, existem variedades que melhor se adaptam às condições geoclimáticas, além do cuidado em se fazer um plantio com variedade de cana com maturação precoce, média e tardia, visando a colher esta matéria-prima sempre no ponto adequado, nos diferentes meses de produção. Quanto à colheita da cana de açúcar, não é indicada a queima do palhiço, pois, além das conseqüências ambientais, a queima prévia da cana resulta no aumento do composto furfural e hidroximetilfurfural na bebida final; ambos são compostos carcinogênicos e sua soma não pode ultrapassar 5 mg/100 mL AA.

Durante o processo de moagem da cana, é importante a análise da eficiência do extração do caldo, que deve ser próxima a 92% em moendas de três eixos. Ainda durante o processo de moagem, é importante o uso de um filtro para recolher os bagacilhos presentes no caldo, já que estes, quando chegam até o processo de fermentação, resultam no aumento do teor de metanol. É importante também a correção do Brix, ou teor de açúcar no caldo, para valores entre 16 e 18° Brix, visando a uma maior eficiência do processo fermentativo.
Engenho-bangüê em funcionamento, década de 1950.
Engenho Espadas, Pernambuco, Brasil

O processo de fermentação é sem dúvida o mais importante para a qualidade do produto final. A fermentação ocorre por ação de leveduras, principalmente a Saccharomyces cerevisae, levedura que apresenta a melhor resistência a altos teores alcoólicos. Ao caldo de cana fermentado dá-se o nome de mosto.

É neste processo que ocorre a transformação da glicose em etanol e outros compostos secundários, como butanol, isobutanol, acetado de etila,(Benéficos ao sabor) e ácido acético, propanol, acetaldeído, etc (Maláficos ao sabor da bebida). O controle apurado desta etapa, como monitoração de temperatura (Entre 28 e 33°C), pH (entre 4.5 e 5.5), contagem de leveduras, tempo de fermentação e formação de excessiva de bolhas é fundamental para a eficiência do processo. O processo de fermentação dura em torno de 24 horas, sendo o teor de sólidos solúveis o indicativo do final do processo. É imprescindível a assepsia deste processo, já que a contaminação bacteriana pode resultar em compostos indesejáveis no produto final.

Em seguida é realizado o processo de destilação, quando o Brix está igual a zero. Se existirem ainda açúcares presentes no mosto, a oxidação destes compostos durante a destilação resultará também na formação de furfural e hidroximetilfurfural. O processo de destilação pode ser realizado em Colunas de destilação (Produção industrial) ou alambiques de cobre ou inox (Produção artesanal), sendo que no primeiro ocorre uma melhor separação dos compostos, produzindo uma cachaça com menos compostos secundários quando comparada com a cachaça artesanal. Durante a destilação, são coletadas três frações: Cabeça (15% do volume destilado), Coração (60% do volume destilado) e Cauda (15% do volume destilado). A composição de cada fração está correlacionada com a temperatura de ebulição dos compostos presentes no mosto. A fração Cabeça é rica em metanol e ácidos, e não deve ser comercializada nem utilizada para consumo. Na fração coração são coletados os principais compostos e mais desejáveis na alguardente. Já na fração cauda, também chamada de óleo fúsel ou caxixi, são encontrados os compostos com altas temperaturas de ebulição.

A cachaça obtida da fração coração pode ser comercializada depois do período de maturação (Três meses) ou ser envelhecida em tonéis de madeiras, por um período mínimo de um ano.Durante o processo de produção da cachaça, são gerados os seguintes resíduos: Ponteira da cana, vinhoto e bagaço.

A ponteira da cana-de-açúcar pode ser utilizada em silagem para alimentação animal. Já o bagaço é rico em fibras, porém pouco nutritivo, especialmente se o processo de moagem foi eficiente. O indicado é utilizá-lo depois de seco, nas caldeiras como substituto de parte da madeira, ou mesmo para a produção artefatos artesanais.

O vinhoto é comumente utilizado como fertilizante e também na produção de biogás em algumas destilarias. Entretanto, este subproduto nao deve, de forma alguma ser jogado em rios ou leitos de água sem tratamento prévio por ser altamente poluente. A cachaça pode ser redestilada para produção de entanol, mas não é aconselhavel o retorno deste produto ao destilador para ser reprocessado.
De acordo com o Decreto nº 4.851, de 2003, o artigo 92 diz o seguinte sobre a cachaça: Cachaça é a denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de trinta e oito a quarenta e oito por cento em volume, a vinte graus Celsius (°C), obtida pela destilação do mosto fermentado de cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de açúcares até seis gramas por litro, expressos em sacarose.

O texto regulamentar básico editado pelo Governo brasileiro para disciplinar a produção e comercialização de cachaça no Brasil é a Instrução Normativa nº 13, de 29 de junho de 2005, baixada pelo Ministro da Agricultura e publicada no Diário Oficial da União de 30 de junho de 2006. A IN nº13/2005, como é conhecida, "Aprova o Regulamento Técnico para Fixação dos Padrões de Identidade e Qualidade para Aguardente de Cana e para Cachaça".

Conforme este Regulamento Técnico, a "Cachaça é a denominação típica e exclusiva da Aguardente de Cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de 48% vol. (quarenta e oito por cento em volume) a 56% vol. (cinqüenta e seis por cento em volume) a 20 °C, obtida pela destilação do mosto fermentado do caldo de cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de açúcares até 6 g/L, expressos em sacarose e Aguardente de Cana é a bebida com graduação alcoólica de 38% vol. (trinta e oito por cento em volume) a 54% vol. (cinqüenta e quatro por cento em volume) a 20 °C (vinte graus Celsius), obtida do destilado alcoólico simples de cana-de-açúcar ou pela destilação do mosto fermentado do caldo de cana-de-açúcar, podendo ser adicionada de açúcares até 6 g/L, expressos em sacarose"

Caldo de cana

Caldo de cana ou garapa é o nome que se dá ao líquido extraído da cana-de-açúcar no processo de moagem.

É rico em sacarose, sendo usado como matéria-prima na fabricação de açúcar, etanol (álcool etílico) e cachaça. O resíduo industrial na destilação, para fabricação de álcool e cachaça, é o melaço, ou mel-de-furo. (Ver Engenho)

O caldo de cana é consumido também in natura, como alimento muito energético. Também é utilizado como base para a produção de melado e rapadura, alimentos muito populares na região nordeste do Brasil.

O valor nutricional da cana está diretamente ligado ao seu alto teor de açúcar (40% a 50% de açúcares na matéria seca), uma vez que o seu conteúdo protéico é extremamente baixo, o que lhe confere a característica de ser um alimento muito desbalanceado em relação a seus nutrientes.

A cana é uma planta composta, em média, de 65% a 75% de água, mas seu principal componente é a sacarose, que corresponde de 70% a 91% de substâncias sólidas solúveis. O caldo conserva todos os nutrientes da cana-de-açúcar, entre eles minerais (de 3 a 5%) como ferro, cálcio, potássio, sódio, fósforo, magnésio e cloro, além de vitaminas do complexo B e C. A planta contém ainda glicose (de 2% a 4%), frutose (de 2% a 4%), proteínas (0,5% a 0,6%), amido (0,001% a 0,05%) ceras e graxos (0,05% a 0,015%) e corantes, entre 3% a 5%.

Além desses o caldo de cana é composto por antioxidantes: ácidos fenólicos (cafêico, sináptico e isômeros do ácido clorogênico), flavonóides (apigenina, luteolina e derivados de tricina) e outros compostos fenólicos. O consumo de apenas 250ml poderia resultar na ingestão de 40mg de fenólicos representando, dessa forma, uma importante fonte desses compostos antioxidantes na dieta.

Rapadura, farinha do nordestino.

Rapadura é um doce de origem açoriana ou canária. É feita a partir do caldo da cana após moagem, fervura, moldagem e secagem típico do Nordeste do Brasil.

Em janeiro de 2006, uma empresa alemã registrou a "rapadura" como sua marca registrada. Em protesto, a coletividade nordestina do Rio de Janeiro mobilizou-se em frente ao consulado da Alemanha com o grito de protesto "A rapadura é nossa, cabra da peste!". O governo brasileiro, através do Itamarati, já se mobilizou para reverter a situação.
O caldo é retirado da cana; . Em Seguida é moído; . Logo depois, um tacho é limpo para a recepção do caldo; . Depois o caldo é colocado no tacho; . Do tacho, o caldo escorre em um cano e vai parar em um balaio, onde é coado para a retirada de algumas impurezas; . O caldo, quando já esta no tacho, o caldo é fervido no tacho (com a elevada temperatura da água, as impurezas irão “boiar” por cima da água, onde são retiradas com uma espumadeira); . Depois da retirada dessas impurezas, o caldo é colocado em uma espécie de caixa de depósito; . O caldo é fervido novamente para engrossar e para retirar algumas impurezas que ainda não foram retiradas; . No momento que o caldo se torna melado, é retirado, coado e colocado em vasilhas; . Depois, o caldo é retirado das vasilhas bem mais engrossado, daí, vai direto para as “canoas”; . Nas “canoas”, o caldo é batido para obter uma liga e para que fique bem grosso; . Ao ser retirado das “canoas”, é colocado no estandarte para ganhar a forma de rapadura; . Depois que a rapadura já endureceu, esfriou e ganhou a sua forma, pode ser retirada do estandarte.